Talvez você não saiba, mas é perfeitamente possível
que todas as suas mensagens por telefone, e-mail e/ou fax estejam sendo
interceptadas por um gigantesco sistema eletrônico de espionagem – o assim
chamado Echelon – e enviadas a um centro de informação situado nos Estados
Unidos.
Paranóia? Coisa de “esquerdinha” que fica
fabricando “teorias conspirativas contra o imperialismo?” Antes fosse. O
pequeno problema é que esse assunto já vem sendo debatido no âmbito do
Parlamento Europeu, e é tão sério que ameaça causar uma crise diplomática entre
França e Estados Unidos.
De fato, no início de julho, apoiando-se em
documentos divulgados pelo Parlamento Europeu, a promotoria pública da França
solicitou formalmente ao órgão francês de contra-espionagem (Serviço de
Vigilância do Território) que investigue a existência e as atividades do
Echelon. Caso se comprove, Paris pretende declarar que Washington promove um
“ataque aos interesses vitais da França”.
O próprio Parlamento Europeu aprovou, em 5 de
julho, a criação de uma “comissão temporária” para investigar o Echelon. A
tarefa da comissão, composta por 36 parlamentares, será a de “verificar a
existência do sistema de interceptação de comunicações e se o Echelon é
compatível com o direito da União Européia”. Segundo um informe do Parlamento
Europeu, publicado em outubro de 1999 a pedido de sua Comissão de Liberdades
Públicas, o Echelon constitui “uma infração do direito comunitário”. Essa
conclusão dá base à ação jurídica francesa.
As evidências da existência e das atividades do
Echelon são contundentes. A “bomba” estourou no começo de janeiro do ano
passado, quando o Parlamento Europeu recebeu denúncias produzidas por seu Comitê
de Avaliação Científica e Tecnológica, segundo o qual, “na Europa, todas as
chamadas telefônicas, os fax e os textos transmitidos por correio eletrônico
(e-mail) são regularmente interceptados e as informações de certo interesse
retransmitidas, através do centro estratégico britânico de Menwith Hill, para o
quartel-general da National Security Agency (NSA), agência central de
espionagem americana”. O estudo afirma, ainda, que os Estados Unidos utilizaram
o Echelon para praticar espionagem econômica e industrial na Rússia, China,
América Latina e em países europeus, como a própria França.
As denúncias apontavam dois casos confirmados de
espionagem econômica pelo Echelon, que beneficiaram empresas americanas em
detrimento de concorrentes europeus. O primeiro envolve o Brasil, mais
particularmente o Sivam (Sistema de Vigilância da Amazônia): em 1994, a empresa
francesa Thomson perdeu o contrato de implantação do Sivam para a americana
Raytheon, no valor de 1,4 bilhões de dólares.
À época, o governo francês denunciou a prática de espionagem industrial pelos Estados Unidos, permitindo que a empresa americana oferecesse um preço melhor no processo de licitação, mas o assunto terminou em pizza, como, aliás, é de praxe nesse país. O outro caso comprovado aconteceu também em 1994, quando o consórcio europeu Airbus perdeu uma concorrência, na Arábia Saudita, para a americana McDonnell-Douglas, “graças ao sistema de escuta eletrônica Echelon, que teria fornecido aos americanos detalhes da proposta européia”, afirma o relatório.
À época, o governo francês denunciou a prática de espionagem industrial pelos Estados Unidos, permitindo que a empresa americana oferecesse um preço melhor no processo de licitação, mas o assunto terminou em pizza, como, aliás, é de praxe nesse país. O outro caso comprovado aconteceu também em 1994, quando o consórcio europeu Airbus perdeu uma concorrência, na Arábia Saudita, para a americana McDonnell-Douglas, “graças ao sistema de escuta eletrônica Echelon, que teria fornecido aos americanos detalhes da proposta européia”, afirma o relatório.
O debate no Parlamento Europeu provocou uma certa
reação no Brasil.
Parlamentares da oposição chegaram a propor, no final de fevereiro, a formação de uma CPI para investigar o processo de licitação para instalar o Sivam. É claro que FHC foi totalmente contra a proposta. O porta-voz de FHC, Georges Lamazière, afirmou que, “do ponto de vista do governo”, não havia nenhuma irregularidade na licitação do Sivam e, apesar do relatório do Parlamento Europeu, o contrato não seria revisto. Para o governo, o que interessa é que a Raytheon teve proposta melhor do que a Thomson.
Claríssimo. Somos mesmo uma colônia, como poderíamos nos atrever a questionar o direito que tem a matriz de nos espionar? Ora…
Parlamentares da oposição chegaram a propor, no final de fevereiro, a formação de uma CPI para investigar o processo de licitação para instalar o Sivam. É claro que FHC foi totalmente contra a proposta. O porta-voz de FHC, Georges Lamazière, afirmou que, “do ponto de vista do governo”, não havia nenhuma irregularidade na licitação do Sivam e, apesar do relatório do Parlamento Europeu, o contrato não seria revisto. Para o governo, o que interessa é que a Raytheon teve proposta melhor do que a Thomson.
Claríssimo. Somos mesmo uma colônia, como poderíamos nos atrever a questionar o direito que tem a matriz de nos espionar? Ora…
Nick Fielding e Duncan Campbell, ex-funcionários do
sistema, afirmaram aos investigadores do Parlamento Europeu que o Echelon foi
utilizado para bisbilhotar até mesmo a vida de gente como o papa João Paulo II
e a princesa Diana, além de organizações como a Anistia Internacional (AI) e o
Greenpeace. Wayne Madsen, que trabalhou durante vinte anos para a NSA, declarou
publicamente, em fevereiro deste ano, que “qualquer um que seja politicamente
ativo eventualmente acabará na tela do radar da NSA”.
O próprio governo americano, que nega formalmente a existência do Echelon, foi obrigado a declarar, em relação a esses casos comprovados de interceptação de informação industrial, que seus “recursos de espionagem” são utilizados contra empresas em “países amigos que fazem concorrência injusta a firmas dos Estados Unidos”.
O próprio governo americano, que nega formalmente a existência do Echelon, foi obrigado a declarar, em relação a esses casos comprovados de interceptação de informação industrial, que seus “recursos de espionagem” são utilizados contra empresas em “países amigos que fazem concorrência injusta a firmas dos Estados Unidos”.
Descartada, portanto, a hipótese de que tudo não
passa de “alucinações da esquerda conspirativa”, vamos agora descrever como
funciona o Echelon, pelo menos segundo o pouco que dele se conhece.
Aparentemente, o sistema começou a ser construído em 1948, bem no início da
Guerra Fria, mediante um acordo secreto (e nunca admitido publicamente)
assinado pelos Estados Unidos e quatros outros países de língua inglesa
(Canadá, Grã-Bretanha, Austrália e Nova Zelândia), que formaram o Pacto Ukusa.
O propósito original desse sistema era o de colher informações sobre a União
Soviética e os seus aliados, no espírito da Doutrina Truman de fevereiro de
1947 (aquela que dizia que os Estados Unidos combateriam a ameaça comunista em
qualquer parte do globo onde ela se manifestasse).
O sistema, batizado como Echelon (palavra de origem francesa utilizada pelos militares de língua inglesa que significa, literalmente, escalão), foi colocado sob a direção da NSA.
O sistema, batizado como Echelon (palavra de origem francesa utilizada pelos militares de língua inglesa que significa, literalmente, escalão), foi colocado sob a direção da NSA.
O sistema é integrado por cinco bases terrestres a
partir das quais são interceptadas as comunicações telefônicas internacionais
que passam pelos 25 canais Intelsat, segundo informa a revista “Cadernos do
Terceiro Mundo” (nº 210, junho de 1999, página 63), citando o livro “Secret
Power”, de Nicky Hager, publicado na Nova Zelândia. Cada país do Pacto UKUSA,
exceto o Canadá, está encarregado de cobrir uma região do planeta. A base que
controla a Europa é a já mencionada pelo relatório do Parlamente Europeu; a que
controla o hemisfério americano, incluindo o Brasil, fica em Segar Grove, a 250
quilômetros de Washington; as regiões do Índico e do Pacífico são “monitoradas”
por três bases terrestres: a de Yakima (base do exército americano a pouco mais
de 200 quilômetros de Seattle), a de Waihopai (Nova Zelândia) e a de Geraldton
(Austrália).
O Echelon, segundo afirma o jornal britânico “The
Independent”, é capaz de produzir pelo menos 3 bilhões de interceptações
diárias. Os computadores empregados pelo sistema, chamados “dicionários”, são
capazes de examinar, decodificar e filtrar quantidades imensas de mensagens
alfanuméricas. Grupos de mensagens que contenham certas palavras-chave são
imediatamente encaminhadas a órgãos específicos da NSA. Se você viu o filme
“Sete Pecados” (David Fincher, 1995), sabe como isso funciona: os computadores
das bibliotecas públicas americanas são programados para identificar e “fichar”
automaticamente os seus usuários que requisitem livros contendo termos
“perigosos” como xiita, Islã, fundamentalismo, comunista etc. Já o filme
“Inimigo do Estado” (Tony Scott, 1998) faz uma excelente descrição de como o
sistema pode acionar os seus satélites, computadores e câmaras para espionar,
localizar e perseguir qualquer pessoa, em qualquer parte do planeta.
As semelhanças com o famoso Big Brother de George
Orwell não são mera coincidência. Qualquer cidadão brasileiro tem razões de
sobra para ficar seriamente preocupado, ainda mais agora, quando FHC começa a
reconstruir os órgãos da ditadura militar, como o sinistro Serviço Nacional de
Informações (SNI) e o Dops (agentes “especiais” da Polícia Federal treinados
pelo FBI na luta contra organizações e manifestações populares).
Não é comovente ver como estão irmanados, na mesma trincheira, o Echelon e os nossos arapongas? Você já não se sente parte do Primeiro Mundo?
Não é comovente ver como estão irmanados, na mesma trincheira, o Echelon e os nossos arapongas? Você já não se sente parte do Primeiro Mundo?