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22 de jun. de 2011

Uma triste história: A agonia de Omayra

Por volta das 21h09min, em 13 de novembro 1985, na cidade de Armero o vulcão Nevado Del Ruiz conhecido como leão adormecido entra em atividade lançando uma grande quantidade de rochas ígneas, derretendo o gelo que o cobre resultando em 4 enormes "lahar" (imenso fluxo de detritos em sua maioria água e rochas que possuem uma força mortal alcançando uma velocidade entre 100 e 300 Km/h) fluindo através de seis grandes rios no sopé do vulcão.

As 23h30min o primeiro lahar varre Armero, poderoso o suficiente para virar carros derrubar arvores e pequenas construções. Toda rede elétrica foi abaixo a cidade, ficou no escuro, alguns instantes antes a jovem Omayra Sanches (de 13 anos) e sua família despertam com um imenso estrondo, as luzes e o rádio se desligam todos então começam a sair de suas casas à procura de lugares seguros até que sua avó cai em um buraco e Omayra tenta resgatar um irmão preso poucos minutos depois tudo vem abaixo, a enxurrada de água, detritos, pedras, invadem a rua e a alcança. Omayra agora encontra-se presa entre entulhos e uma água muito fria sem conseguir libertar-se, a jovem passa cerca de 12 horas presa até que a primeira equipe de ajuda chegue. Nesse meio tempo mais três fluxos de lahar engolem toda a cidade de Armero.

Os trabalhadores humanitários enfrentaram muitas dificuldades em razão da composição da lama ficava difícil percorrer o terreno sem ficar preso. Ao chegar todos se horrorizaram com a paisagem da cidade de Armero (com cerca de 30 mil habitantes) havia pilhas de escombros, arvores caídas, corpos desfigurados espalhados por todos os lados.

Quando a equipe encontrou Omayra perceberam que não conseguiriam tirá-la dali, ela estava presa pelas pernas.

E assim a pequena Omayra, com lama até o pescoço, ficou presa por três dias agonizantes cercada de pessoas que estavam de mãos atadas, a jovem permaneceu forte até os últimos instantes, apesar do sofrimento, conta a jornalista Cristina Echandía que nesse tempo a jovem teve conversas normais e cantou algumas musicas junto com a equipe que no fundo orava por um milagre.

Mas o milagre não veio, e no terceiro dia ao anoitecer a jovem Omayra denota sinais de que a gangrena e a hipotermia estavam vencendo ela, e começando a ter alucinações a jovem passa a se comportar como-se fosse um dia comum dizendo que precisava sair logo, não podia se atrasar, estava na hora de ir pra escola.

Em determinado momento Omayra fala para todos saírem porque ela precisava descansar.

Os últimos momentos de sua vida foram acompanhados por diversas pessoas dentre elas o fotografo Frank Fournier que eternizou esse momento, tornando esta fotografia num marco em diversos sentidos, e ainda uma equipe de televisão que gravou uma tomada poucos minutos antes de sua morte.

O vídeo no Youtube pode ser visto aqui:
A tragédia (segunda pior catástrofe vulcânica) abalou a cidade de Armero exterminando três quartos da população, cerca de 22 mil pessoas (detalhe a cidade tinha uma população estimada em torno de 30 mil habitantes)

Abaixo você pode ler o relato do fotógrafo Frank Fournier:

"Eu cheguei a Bogotá de Nova York uns dois dias depois da erupção do vulcão. A área para onde eu precisava ir era muito remota. (Chegar até lá) envolvia uma viagem de carro de cinco horas e depois mais duas horas e meia de caminhada.

O país também estava num tumulto político. Pouco antes da explosão, o Palácio da Justiça, em Bogotá, havia sido tomado por guerrilheiros de esquerda do M-19. Muitas pessoas tinham sido mortas e isso tinha tido um grande impacto na forma como as pessoas da cidade de Armero foram ajudadas. O Exército, por exemplo, havia sido mobilizado para a capital.

Eu cheguei ao vilarejo de Ameroyo de madrugada, cerca de três dias depois da explosão. Havia muita confusão, as pessoas estavam em choque e precisando desesperadamente de ajuda. Muitos estavam presos em entulhos.

Eu encontrei um fazendeiro que me contou dessa menininha que precisava de ajuda. Ele me levou até ela, ela estava praticamente sozinha, havia apenas algumas pessoas em volta e alguns funcionários de resgate ajudando outra pessoa perto dali.

Ela estava num grande lamaçal, presa da cintura para baixo por concreto e outros restos das casas que haviam desabado. Ela estava ali por quase três dias. Começava a amanhecer e a pobre menina estava sentindo dores e muito confusa.

Em toda parte, centenas de pessoas estavam presas. Os funcionários de resgate tinham dificuldade em chegar até as vítimas. Eu conseguia ouvir as pessoas gritando por ajuda e depois silêncio, um silêncio sinistro. Era muito assustador. Havia alguns helicópteros, alguns que haviam sido emprestados por uma companhia de petróleo, tentando ajudar as pessoas.

E daí tinha essa menininha e as pessoas não tinham poder para ajudá-la. Os funcionários de resgate voltavam para falar com ela, fazendeiros locais e algumas pessoas que tinham algum tipo de ajuda médica. Eles tentavam confortá-la.

Quando eu tirei as fotos eu me senti completamente impotente na frente dessa menininha, que estava enfrentando a morte com coragem e dignidade. Ela podia sentir que a vida dela estava indo embora.

Eu achei que a única coisa que eu podia fazer era retratar adequadamente a coragem, o sofrimento e a dignidade dessa menininha e esperar que isso mobilizasse as pessoas a ajudar aqueles que haviam sido resgatados e salvos.

Eu senti que eu tinha que retratar o que essa menininha teve que passar.

A essa altura, Omayra já perdia a consciência, às vezes recobrando-a. Ela até me perguntou se eu podia levá-la para a escola porque ela estava preocupada que chegaria atrasada.

Eu dei o meu filme para alguns fotógrafos que estavam voltando para o aeroporto e pedi para que eles o mandassem para o meu agente em Paris. Omayra morreu cerca de três horas depois de eu chegar lá.

Na hora, eu não percebi o poder da fotografia, a forma como o olho da menina se conectou com a câmera.

A fotografia foi publicada na revista Paris Match alguns dias depois. As pessoas ficaram muito perturbadas porque o drama de Omayra havia sido capturado pelas câmeras de TV e levado ao mundo. Daí a minha fotografia dela foi publicada depois de ela ter morrido.

As pessoas me perguntavam: 'Por que você não a ajudou? Por que você não a tirou de lá?' Mas era impossível.

Houve alarde, debates na televisão sobre a natureza do fotojornalismo, se o profissional era uma espécie de abutre. Mas eu senti que era importante que eu registrasse a história e eu fiquei mais feliz pelo fato de ter havido alguma reação. Teria sido pior se as pessoas não tivessem se importado.

Eu sou muito claro sobre o que eu faço e como faço e eu tento fazer o meu trabalho com o máximo de honestidade e integridade possível. Eu acredito que a fotografia ajudou a levantar dinheiro de todo o mundo e ajudou a destacar a irresponsabilidade e a falta de coragem dos líderes de governo.

Houve uma falta de liderança óbvia. Não havia planos de evacuação, embora os cientistas tivessem previsto a extensão catastrófica da erupção do vulcão.

As pessoas ainda acham a foto perturbadora. Isso destaca o poder duradouro dessa pequena menina. Eu tive sorte porque pude agir como uma ponte para ligar as pessoas com ela. É a mágica da coisa.


Há centenas de milhares de Omayras pelo mundo – histórias importantes sobre os pobres e os fracos –, e nós, fotojornalistas, estamos lá para criar a ponte.

A questão do poder da imprensa é muito mais importante hoje do que nunca porque estamos sob muita pressão do lado comercial.”